Sou doente.

Nunca vamos dar certo.
Ele é louco e eu também.
Ele parte a casa e eu parto o quarto.
Eu tento-o encontrar em outras pessoas.
Ele nem sabe o que encontrar.
Ele não sabe o que é que lhe corre nas veias.
Eu sei que me corre amor e ódio.
Quase nunca estou sóbria de mim.
Ele quase nunca está sóbrio de nós.
Eu tento-me sempre apaixonar.
Ele não se apaixona.
Tento-o ver em gente normal.
Ele sabe lá o que é normalidade.
Eu arranho as paredes e o corpo.
Estou cheia de arranhões.
Ele arranha a alma.
A minha alma é podre.
Ele perdeu a dele.
Os dias cá em casa não passam.
Os dias dele tornam-se em meses.
Esperei duas vidas.
Por ti.
"Gosto de ti."
"Escrevi-te um blog."
O nome dele está na boca das pessoas.
E ninguém sabe o nome.
As pessoas partilham o que escrevo.
"Que bonito que é".
Mas não é.
Não somos bonitos.
E quem nos viu a ser, nunca contou o que viu.
"Ela é louca."
"Ele vai pô-la mais louca do que já é."
"Inês, vais perder a cabeça."
Ninguém o vê como eu.
Ele nunca me viu.
Ele sabe a amor.
E eu tenho o gosto dele.
Nunca consigo dormir.
Nunca consigo dormir com o sabor dele.
O meu pai diz.
"Inês, estás bem?"
"Sim."
"Não te sinto cá."
"Nunca cá estive."
Cada vez que viro as costas, quero-o sempre mais.
Ele nunca sentiu, que eu lhe virasse as costas.
Ele é tóxico.
E eu sou doente.
Estamos doentes.
O poema mais curto do mundo.
Tu.
Sem nada, nem ninguém.
Sozinho.
Numa sala, cheia de pessoas.
E mesmo assim, sem ninguém.