O outro lado do amor.



Nos últimos tempos, a minha principal ocupação é tentar tomar atenção ao que se passa no meu dia-a-dia e jurar para mim mesma que o passado pertence no passado. Todos nós sabemos o quanto custa o ritual do "Fazer de conta que já não se gosta", mas a pergunta que me tinham colocado "já o esqueceste?" deu-me a volta ao estômago. Mexeu comigo, deu-me saudades, deu-me nostalgia, deu-me lembranças, trouxe-me a voz dele outra vez ao ouvido e lembrou-me o quanto estava desprotegida agora que já não o tinha para me agarrar sempre que chorava ou proteger-me de alguém que me queria mal. Deu-me o que nos dá a nós mulheres, sempre que compreendemos que perdemos a batalha do amor. 
De dizer aos nossos pais e às nossas mães que ele é o tal, que sentimos que desta vez é diferente, que ele é a melhor pessoa do mundo mesmo quando sabemos tudo o que há por trás e quando no fim, chegamos borradas da maquilhagem a casa, num pranto, com menos dez quilos em cima e aceitamos o facto que afinal, a nossa mãe até tinha razão.
Eu caí no hall de entrada a primeira vez que entrei em casa e compreendi que já não ia sair mais para lhe voltar a dar a mão. Deixei-me cair. E chorei durante uma tarde toda. E depois de todas essas imagens me terem passado pela cabeça nos segundos a seguir a ter dito que "Não(,não o esqueci)" interrompi a conversa fútil que se estava a voltar a instaurar na mesa e respondi que "Ninguém esquece alguém que um dia amou". E refundi-me outra vez em mim própria, nas minhas coisas e na minha cabeça, a suspirar de vez em quando e a olhar para o nada, a pensar quando é que ia aparecer alguém na minha vida que me fizesse esquecer, o que um dia aconteceu em mim.
O outro lado do amor é uma merda, e nunca nos meus anos de relação pensei ser possível chegar a um sítio tão baixo, que nem as mãos mais compridas ou com as melhores intenções me poderiam tirar de lá.
As saídas que encontramos por nós próprios e não com outros corpos ou outras pessoas, são aquelas que nos fazem crescer mais. E eu cresci tanto num tão curto espaço de tempo que já me doía o corpo todo do esforço que estava a fazer por mim própria. Levantar-me sozinha das quedas que dei, voltar a aprender a andar sozinha na rua, não te ter para me guiar fosse por onde fosse, ou a minha casa ser agora, a única casa em que dormia e passava os meus dias.
          Ninguém esquece alguém que amou, disse-o e sei agora que o disse bem. Eu esqueço-me de meter a roupa a lavar, esqueço-me de ligar a alguém, ou do sítio onde deixei as chaves, mas quem marca a nossa vida fica sempre de uma maneira ou outra, entranhado em nós. Molda-nos, faz-nos como pessoas, muda-nos, e quando nos deixa, prepara-nos para uma data de situações que antes, não estaríamos preparados.
           O meu ex-namorado ensinou-me muita coisa sobre os homens, e a melhor de todas foi a saber perdoar.  Quando arranjei forças suficientes em mim para o perdoar, perdoei-me a mim própria por tudo o que fiz e tenho feito também, ao longo da vida.
           O amor é possivelmente das coisas mais bonitas que acontece na vida de alguém, quando é verdadeiro, sentido e partilhado. A sensação de darmos a mão a quem gostamos, ou termos alguém em quem nos enroscar quando sentimos que mais ninguém serve, enche-nos a alma e faz-nos sentir que afinal, nem tudo é tão pouco como nos parece ser.
           Por outro lado, o amor assume formas estranhas durante tempos estranhos se assim o podemos chamar, e do sonho passa à doença.
           A febre que o amor nos dá, não passa com medicação nem com banhos de água fria. Passa com o tempo, com o suor, com o arrependimento de nos termos envolvido com pessoas erradas, com o esforço de tentarmos tirar as memórias desses mesmos envolvimentos da cabeça, com a dor de não termos tanto nos dias de hoje para partilhar como antigamente, e de aceitarmos que somos substituíveis.
            Um dia, vai aparecer alguém, com maneiras e gestos diferentes, que nos vai amenizar as feridas e fazer-nos acreditar que afinal, o amor pode ser bem mais simples do que aquilo que pensamos.
            Há uma praia para todos, depois da sombra.

Novembro, 2013.


Comentários

  1. Gostei bastante! Especialmente o toque final da "Se cuidas de mim" :)

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  2. Chorei ao ler.. A tua situação é em muito semelhante à minha. Parece que te exprimes por mim. Obrigada! :)

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    1. Obrigada! É mesmo essa a intenção de alguém que escreve, tentar exprimir-se pelos outros! Um beijo

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  3. Adorei! Sei bem o sentimento que falas e a falta que sentimos da outra pessoa, mas tal como tu dizes "ninguém esquece alguém que um dia amou" por isso vou aprender a viver com isso ;) *

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  4. Olá Inês! Há algum tempo que acompanho o teu blog. Revejo-me em imensa coisa que escreves. Também eu fui escrevendo sobre o que sinto, parece que torna as coisas mais fáceis.
    Obrigada por partilhares os teus textos, são lindos.

    Beijinhos :)

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  5. Escreves tão bem Inês, muitos parabéns mesmo! Nunca deixes de escrever fiquem fã do teu blog!

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  6. Cheguei ao teu blog agora mesmo e sem dúvida que vou continuar a acompanhar. Está optimo e escreves de uma forma top, que me levou a ficar preso do início ao fim do post. Um dia vais acordar e ele já não será a primeira pessoa em quem irás pensar, acredita : )

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  7. Inês, quando voltas a escrever? Adoro os teus textos, miuda :)

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  8. A verdade, é que os teus textos são uma realidade. Não consigo arranjar palavras para dizer-te o quanto tocas nas pessoas. Choro no fim de muitas frases. Só me resta agradecer-te!

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  9. Muito bonito. Uma exposição clara e certeira do que é a outra face do amor. Parabéns e continua o bom trabalho.

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  10. Revejo-me em todos os textos que escreves.E tenho sentimentos contraditórios. Os primeiros sentimentos são tristeza e nostalgia porque penso, "não devias de ler isto, porque vais te lembrar dele e não devias". Faz-me pensar/recordar em momentos e coisas que já passaram à algum tempo e que por mais que eu tente manter-me forte, vou abaixo. As lágrimas vêem-me aos olhos e penso na falta que ele me faz. O meu namoro de 4 anos acabou a cerca de 6 meses. E custou-me os olhos da cara, porque eu não perdi só um grande amor, perdi o meu melhor amigo. Mas penso que não preciso de estar aqui a divagar e a explicar o que sinto, porque pelo que li dos teus textos sei que percebes perfeitamente. Voltando à questão, os segundos sentimentos são esperança e conforto, "Há uma praia para todos, depois da sombra.". Sei que um dia esta dor e saudade vai passar. Não sou ingénua ao ponto de pensar que sempre que o vir não vai "mexer cá dentro " como tu dizes "...quem marca a nossa vida fica sempre de uma maneira ou outra, entranhado em nós. Molda-nos, faz-nos como pessoas, muda-nos, e quando nos deixa, prepara-nos para uma data de situações que antes, não estaríamos preparados.". E é totalmente verdade, porque eu sinto que já mudei muito.
    Espero que não entendas isto que te disse como algo mau, porque eu acho que escreves lindamente (quem me dera escrever assim). Porque dizes tudo o que eu sinto e não consigo por para cá para fora. Dói, doi muito, mas é bom saber que alguém lá fora sente exactamente aquilo que tu sentes e compreende-te. Porque por mais que os teus amigos te apoiem e tentem compreender, parece que nunca compreendem totalmente, e quando leio os teus textos sinto que me compreendes totalmente.
    Obrigada pelos textos e continua a escrever, desculpa este desabafo enorme.

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    1. Passa-se exatamente a mesma coisa comigo, a diferença é que o namoro já acabou à 1 ano. Continuo com esses sentimentos contraditórios.

      Inês quando voltas a escrever? Tenho saudades de ler um texto teu. Escreve um texto de esperança por favor!

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    2. Que linda!! As tuas palavras tocaram-me muito, é bom saber que toco nas pessoas assim só através do que escrevo, um beijo grande, em breve mando outro cheio de esperança eheh ;) !!

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    3. Parece que há mais alguém que se sente como eu e com a mesma opinião que eu, que os textos da Inês nos ajudam muito e ter esperança de que alguém novo irá aparecer na nossa vida e fazer com que os cacos que outros deixaram se colem de novo para voltarmos a ter esperança e sermos pessoa melhores! Muito Parabéns Inês, pelo que escreves e porque o escreves de uma forma tão simples e continua porque precisamos de ti e dos teus textos!

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  11. Vim parar aqui hoje e adorei todos os textos que escreves. Tive que deixar o meu elogio à sinceridade das tuas palavras. Identifiquei-me bastante em muitas delas.. Continua :)

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