adeus primavera

quando te conheci, o céu encheu-se.
todos cantavam, tudo se poderia emoldurar, encantaram-se enquanto nos olhavam.
a primavera chegou, pensei eu.
farta de mau tempo, roupa pesada, e ver o que sempre quis dizer, transformado em desabafos que o tempo comeu, abri os braços e deixei-te entrar.
Nunca ninguém disse "Inês" da mesma maneira, tratou-me por "amor" sem eu achar cliché; o meu novo nome era amor, e assentava.
assentava-nos, porque amor estava em todo o lado, desde que tu lá estivesses.
a primavera veio para ficar, pensei eu.
nada farta do tempo que se instalou, de esperar por ti no elevador, de ver a tua roupa junta com a minha, de estender o braço a meio da noite só para saber, que a primavera tinha chegado.
menino, se eu gostei da primavera.
se eu gostei de os ouvir cantar, de te dar a mão, de te ter ao alcanço de um palmo.
se eu gostei de saber que só tinhas olhos para mim, de te apanhar a olhar-me, de te ver a chorar e a rir, de sentir que nunca, nunca mais, ia deixar de ser primavera.
mas a primavera tornou-se estranha.
o céu não se enchia mais, já ninguém cantava, as fotografias ganharam pó, e quem nos olhava já eram os abutres, esses que nunca foram, da nossa primavera.
e eu tentei cantar para abafar a falta da música, atirei baldes de tinta na nossa casa, tirei-te fotografias, e nunca parei de te chamar amor.
amando-te compreendi, que o caminho a dois, se torna pesado quando não o tornas diferente.
e eu que nunca gostei de frio, joguei-me nua para dentro de mim mesma, onde já muito pouco se torna em calor, e onde esse mesmo pouco, se tornou demasiado para mim.
adeus primavera, foi um prazer.